Meus Amigos
Um dia, depois de meses de trabalho, termina-se a projecção de um filme, que é também a projecção daquilo que pensamos e sentimos. Tem defeitos e qualidades, mas isso não é verdadeiramente importante - o filme existe e vai ser o objecto da nossa relação com os outros.
Gostaria, no futuro, de contar "histórias", mas ainda lá não estou; por enquanto, este filme, MEUS AMIGOS, é um exercício do meu olhar sobre as pessoas que me rodeiam.
Não aplico truques para fazer cinema porque não sei como é, nem quero saber.
Não pretendo também nem entreter, nem convencer ninguém.
Penso, no entanto, que isto de olhar para os outros é mais difícil do que parece, porque é preciso dizer o que se tem a dizer sem hostílizar. Com afeição e crueza ao mesmo tempo, para fazer avançar relações quase inexistentes entre as pessoas.
A ostentação, tornando demasiado presente a máquina de filmar e imiscuindo-a nos gestos das pessoas, pode retirar à imagem o valor de elo possível entre aqueles que são filmados e que são pessoas e não fantoches, e os que estão na sala e que são também pessoas e não espectadores.
Para realizar essa festa de convívio, que é o cinema de que falo e que procuro fazer, é apenas preciso viver e estar atento.
Só que nem sempre é possível o testemunho que pretendemos.
António da Cunha Telles